Sunday, November 18, 2007

Parece um teorema

Muitas coisas novas aconteceram naquele verão, em minha vida. Todas as mudanças percebidas no corpo, que finalmente começava a se parecer com um corpo de mulher, não eram nada se comparadas à avalanche de coisas que passavam pela minha cabeça. Desenho animado ou beijos de novela, peço a Susie ou um sutien para usar sob o uniforme, falo com ele ou escrevo outro poema.
Foi no meio dessa avalanche, que me meti entre os maiores na casa da minha tia Nilza, para ouvir uma música que falava de índios e deixava a todos enlouquecidos, provocando discussões acalouradas. Antes que a minha irmã mais velha percebesse a minha presença e me enxotasse dali, já tinha me apaixonado pela beleza dos versos do Legião. Tão doces e tão fortes.
Conheci uma nova poesia, que não falava apenas de garotos e corações dilacerados, mas discutia coisas bem mais sérias, como as notícias que painho via no Jornal Nacional. Nunca imaginei que elas pudessem virar versos. Estava atônita, tentava entendê-lo, repeti-los.
Esse exato momento da minha vida me veio à tona por esses dias, quando uma situação me fez lembrar o verso, “é só você quem deve decidir o que fazer pra tentar ser feliz”. Busquei então a música, e comecei a pensar nesta grande responsabilidade que tantas vezes empurramos com a barriga. Até porque é tão mais fácil ficar repetindo a culpa da crise econômica, dos homens que não querem se comprometer, do chefe que não compreende, do cabelo crespo, da dificuldade para emagrecer, dos hormônios na TPM...
Assim como, quando éramos adolescentes, as dúvidas sobre a vida e sobre o sexo oposto continuam perturbando nossos dias, mas apesar disso e de não termos mais a poesia do Legião, ainda está em nossas mãos, tomar decisões sobre o que fazer pra tentar ser feliz. Então lamento, se você escolheu ficar com alguém, que não sabe o que quer da vida, vai ter que arcar com o ônus do sofrimento, das discussões, do vou não vou. Se você escolheu uma carreira que não vai te deixar rico, lá vem alegria de fazer o que gosta com o ônus de estar sempre duro.
Mainha sempre diz que ninguém fica feliz com o que tem no momento. É como se a felicidade fosse sempre um projeto para o futuro. Se está solteira queria muito estar namorando ou até casada, mas se está namorando, perde várias horas pensando em como seria ótimo estar solteira e por aí vai.
Filosofias à parte, a verdade é que, as dúvidas e medos da adolescência, jamais abandonam a nenhum de nós, mudam os assuntos, os alvos, mas a busca pelo que não temos e a dificuldade de aceitar que nossa felicidade é o resultado das nossas escolhas, isso sempre estará aqui. Como diz o Legião, parece um teorema sem ter demonstração e parece que sempre termina mas não tem fim.

Não quero mais ser adulta

Sei que parece tarde para esta declaração, mas só com a chegada da aguardada maturidade é que me dei conta de como era melhor ser criança, adolescente e tudo mais.
Passei a vida lutando para ter expressão e agora ouvi da minha dermatologista que minhas rugas são culpa disso.
Sonhava com o dia que teria pelos. Esses mesmos que agora faço tudo pra arrancar em sessões dolorosas de depilação.
Tudo o que eu queria era alcançar a independência, ir pra onde quisesse sem ter que dar satisfação, mas duvido que as fadas que voavam nas histórias que eu lia, pagassem IPVA, pedágio e taxa de abertura de crédito.
Além de tudo, justamente agora que eu descobri tudo o que eu quero e preciso pra ser feliz, veio junto a certeza de que eu não depende só de mim, exatamente como a decisão de mudar de escola.
Acordei com muita vontade de fazer manha, inventar que estou com dor de barriga pra não sair da cama até as 11 e depois passar o dia fazendo coisas divertidas. Mas meu castelo depende de mim pra se manter de pé, cresci pra virar princesa, guarda do palácio e tesoureiro do rei, não contava com isso, eu juro.
Porque eu não posso simplesmente chegar em casa chorando e dizer pra minha mãe que conheci um garoto chato que me beijou e depois puxou meu cabelo ou alguma coisa assim? Tenho certeza que ela ligaria pra mãe dele que seria obrigado a me pedir desculpas. Afinal, não é assim que se trata uma menina.
Bem, mas não adianta chorar pela boneca quebrada, o jeito é criar coragem, sair da cama e encarar o mundo e as rugas. Afinal, não é tão ruim assim, ainda temos a liberdade pra brincar de médico, tomando os devidos cuidados é claro e ainda dá pra ir á praia, com filtro solar, óculos e chapéu, mas dá. Também ainda podemos tomar sorvete, comer pipoca e brigadeiro, tudo diet, mas nem tudo é perfeito.
Aliás nada é perfeito, mas agora preciso ir, antes de dormir ainda tenho que resolver se ligo ou não ligo, passar o ácido pra amenizar as rugas de expressão e escovar os dentes, porque apesar da minha mãe não estar olhando, dentista está pela hora da morte. Meus sais.