Eu ganho um presente todos os anos no dia dos pais, ao saber que o meu pai ainda vive, a contar histórias sentado em sua varanda.
Meu pai não me deu uma festa de debutante, mas eu jamais vou esquecer aquela noite de Janeiro, quando ele convidou um grupo de reisado a entrar em nossa casa para nos brindar com um show.
Meu pai nunca me levou a Disney, mas foram tantas as viagens de veraneio, quando circulávamos descalças entre as barracas do camping. Tantos dias girando de braços abertos à beira do mar. Tantas noites de lua vendo-o pescar sob as estrelas que pipocavam no céu como fogos de artifício.
A honestidade é tudo no mundo, filha. Quantas vezes essa frase foi repetida, como se proferida por um daqueles filósofos gregos. E era apenas meu pai.
Era apenas ele, que desafiava a minha timidez, ao me colocar sobre a mesa de centro, para recitar meus poemas de menina e depois sorrir orgulhoso. Eu ainda posso ouvir.
Eu não tive um desses pais de comercial de TV, que chegam para o jantar e ajudam com os deveres de casa. Mas a sua presença sempre foi tão esperada, que quase não dormíamos quando se anunciava. Talvez as madrugadas mais felizes da minha vida, a que ele chegou com um pequeno filhote ou aquela outra com a bolsinha de palha, enfeitada com cordinhas cor-de-rosa.
Meu pai não me ensinou a dançar, mas me deu força todas as vezes que eu tentei.
Meu pai não me ensinou a falar bonito, mas estava lá com sua risada, sempre que eu me arriscava.
Meu pai não me ensinou a acreditar em Papai Noel, mas chegou tantas vezes de madrugada trazendo presentes.
Meu pai foi peão, adestrador de cavalos, caminhoneiro, fazendeiro, mas nunca foi um herói. Ainda bem, porque já se arriscava bastante sem sê-lo.
Ensinou-me a fazer arroz tropeiro, a assoviar e a acreditar que tudo está sempre bem. Não me ensinou arte ou ofício, além do mistério de fazer amigos.
Um dia ele me disse: Levanta a cabeça filha, não tenha medo de nenhum homem porque você é filha de um. Nunca mais abaixei a minha cabeça e desde então ando com ela erguida, olhando a todos nos olhos.
Meu pai vive tão distante, em seu mundo de sonhos, cavalgadas, riachos e bezerros recém-nascidos. Mas é presença constante em meu mundo, em meus sonhos e em tudo o que eu faço.
2 comments:
Lindo demais!
É impressionante como nossos pais são capazes de nos deixar, mesmo involuntariamente, marcas maravilhosas ao longo de nossas vidas!
Saudades dos meus!! Ehehee
Beijocas
Liu,
Entrei hoje para ver as novidades e como sempre me emocionei com esta linda msg. Como me faz bem ler seus textos. ai ai ai
Guardando as devidas proporções e adaptando a minha realidade eu concordo com vc "Meu pai não é um herói. Ainda bem." meu pai é simplesmente o MEU PAIIIIIIIIIIIII e isso é tudo o que precisamos.
Beijos
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